Estamos quase na metade de 2025, embalados pelas festas juninas, e muitos empreendedores já não sofrem mais com aquele período morno de vendas que marca os primeiros meses do ano, deixando no passado aquela clássica desculpa dos clientes: “só vou esperar o Carnaval passar.”
Pelo menos está sendo assim para a Bia.
Sua produtora de eventos está a mil, com uma série de projetos em andamento. A coisa vai tão bem que, pela primeira vez no ano, o dilema é: “o que eu faço com esse tanto de dinheiro na conta”?
A vontade da Bia era já colocar esse dinheiro na reserva financeira e – se necessário – tirar de lá e seguir a vida. Mas essa decisão simplificada não é a minha favorita.
Atendendo pequenos negócios, fica nítido que aqueles que banalizam o movimento de resgate da reserva são os mesmos que não conseguem ganhar consistência na construção de um volume legal de dinheiro.
E, quando falo de um volume “legal” de dinheiro, falo da construção de algo que realmente traga segurança para imprevistos, que proporcione ao empreendedor maior flexibilidade para ajustar formas de pagamento e aumentar a taxa de conversão, e que ofereça ao negócio a condição de esperar, sem precisar aceitar tudo a qualquer preço só para pagar o aluguel do mês.
A forma como a gente encara o nosso patrimônio tem impacto nisso.
Nos investimentos, se não temos clareza dos nossos próximos passos, fica praticamente impossível decidir onde alocar ou não o dinheiro. Assim, aquela famosa frase “Para quem não sabe para onde vai, qualquer caminho serve”, do Gato de Alice no País das Maravilhas, faz todo sentido.
Antes de pensar em onde colocar ou deixar de colocar o dinheiro, é importante olhar pra frente, e não só dentro da cabeça, mas colocar no papel ou planilha (isso faz toooooda diferença).
Suponhamos que a Bia tenha uma projeção de caixa mais ou menos assim:
Quando batemos o olho nessa projeção, é possível identificar problemas claros! Apesar de ter chegado a junho com um caixa inicial relativamente alto e ter a perspectiva de um mês ótimo, a história esperada pra julho é bem diferente.
E aqui, não estamos falando de adivinhar o inimaginável. A projeção apresentada é uma estimativa de valores próximos ao que realmente esperamos que aconteça.
No desenho acima, tudo acontece conforme o previsto, sem surpresas. O ponto é que, ao colocar tudo no papel, o cenário abstrato se torna claro e definido.
Se, sem ver esta projeção, a Bia tivesse decidido investir 70 mil, por exemplo, era esperado que em julho ela já precisasse sacar um tanto, em agosto mais outro tanto. E boa parte daquele dinheiro que ela ficou tão feliz em juntar foi embora outra vez, dando a ela a sensação de fracasso e de que essa história de juntar dinheiro realmente não é pra ela.
Para mim, não seria uma grande surpresa descobrir que, por qualquer motivo aleatório que seja, até mesmo parte do dinheiro restante fosse consumido aos poucos. Bem naquela linha do “já que nada dá certo, então vou aproveitar e usar esse dinheiro com coisas que quero”. E isso aqui é um perigo.
Provavelmente, eu, no lugar da Bia, investiria algo entre 40 e 50 mil reais em um CDB com liquidez diária e rendimento próximo de 100% do CDI, assumindo o compromisso de não mexer nesse dinheiro tão cedo, exceto em caso de necessidade extrema. E se eu realmente quisesse investir esse valor extra, mesmo que por pouco tempo, não o misturaria com aquilo que considero reserva financeira.
E uma coisa que me chama atenção nesse fluxo de caixa projetado é isto aqui:
Desse desenho, esta é a parte que mais deveria acender um alerta pra Bia. Uma empresa que opera, ao longo de 7 meses de um ano comum, com uma média de lucro negativo (o famoso prejuízo) tem assuntos importantes para serem observados.
Vejo que um bom dinheiro em caixa é também uma oportunidade para mergulhar na estratégia do negócio. É hora de aproveitar o fôlego e pensar ações que melhorem o resultado financeiro no longo prazo. É um respiro pra lidar com assuntos importantes e sem o desespero de saber se as contas estarão pagas ou não. É até mesmo uma oportunidade para contratar consultorias que tratem do atual gargalo do negócio.
Ter uma postura protagonista não é importante só nos momentos de baixa, mas também nos momentos de alta, é essa postura que leva o negócio para outro lugar. A gente sai dessa posição reativa e sempre acuada. Poder se afastar da urgência e olhar para o todo é o que nos dá a condição de resolver os problemas estruturais do negócio almejando soluções que de fato sejam mais sustentáveis e duradouras.
Onde investir o dinheiro pode parecer o tipo de dor de cabeça que todo empreendedor gostaria de ter, mas é também uma oportunidade para olhar para os reais problemas que aquele negócio desafia.